quinta-feira, 30 de agosto de 2012

Da porta trancada

É chato querer se doar de novo e não saber por onde começar. Quer dizer, de repente batem à tua porta e tu não sabes o que oferecer.

Ei, podes passar mais tarde? Alguém já veio aqui antes e levou tudo embora.

Já chega disso

Parem de falar absurdos, parem de achar que sabem de tudo!

Desliguem a linha de raciocínio e vão dormir.

sexta-feira, 24 de agosto de 2012

Fogo

O calor mantinha seu corpo aquecido, afogueado. O fogo queimava, ardia e, ainda sim, lhe fazia bem. Era a base de todo o controle humano. Causava torpor.
Mas mesmo com todo o seu interior acalorado, mesmo com o arrepio de pele e a exaltação descontrolada, continuava por escolher as grandes pedras de gelo. Aquelas frias, sem sentimentos, onde criara seu abrigo contra o ardor.
E permanecerá assim, amarrado entre boas e quentes sensações e a fria paz na consciência.
E continuará movendo-se entre semelhantes geleiras, em cada tentativa frustrada de fazer cessar a chama.

quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Catuípe

Já faz anos. Os móveis se foram, o aposento se transformou em outro cômodo qualquer.
Porém, admito, sinto saudade daquele tempo em que eu brigava por um pacote de bolachas ou discutia pelo controle da TV. Um tempo em que eu não me sentia tão sozinha. E, provavelmente, ele não saiba de nada. Talvez não desconfie do quanto é importante pra mim. O quanto faz falta.
Mas agora há mais paredes nesta casa. Também há mais silêncio, menos motivos para risadas.
Em verdade, nunca fui boa ao expressar emoções. Entretanto, confesso que até hoje abro um sorriso quando vejo seu carro parado em frente ao portão.
Minha memória também não é lá grandes coisas. Esqueci detalhes, mas os importantes ficaram, garanto. Lembro-me de sentir orgulho ao perguntarem se eu era a sobrinha do “Catuípe”. Recordo-me daquele cara cabeludo, me carregando nas costas. O mesmo que me ajudava a cavar buracos e construir castelos de areia. E dói um pouco saber que não o encontrarei quando eu acordar. E dói ainda mais quando lembro que, após receber xingamentos, não terei ninguém em minha defesa. Muito menos terei um espaço entre o armário e a cama, no quarto ao lado, o vão onde poderei me esconder.
Mas eu sempre fui só, nunca reclamei. Jamais tive motivos para tal reclamação. Eu tinha aquele que me foi dado como tio, aquele que eu insisti e transformei em irmão. Só eu sei a saudade que bate às vezes.

E agora eu cresci, e ele continuou a crescer. Eu não o olho mais de baixo e a gente não discute mais por futilidades. Eu não o vejo todos os dias, ele não repete a típica reclamação de eu ser “a criança mais insuportável do universo”. Também não me preocupo mais ao comer uma sopa, sei que não terás enchido a mesma com pimenta quando ninguém estiver olhando. Pois não estás aqui.
Lembro, tristemente, de algo mais recente: chorar e ver o ser mais forte de todos, chorando. E as vezes me pergunto se estás bem, se estás feliz. Porque, de repente, desvairou-se, como água entre os dedos. Não pude impedir.
Eu só sei que, do nada, partiu. Lembro que fiz pouco caso, ignorei abraços e um pedido de “fica”. De qualquer forma, não teria adiantado. Eu sei que, ainda sim, ele iria. Pois precisava, já eras hora.
É claro, eu sei que sempre que precisar estarás aqui. Sei que sabemos nos entender apenas com gestos e pensamentos. Sei que não teremos muito assunto, falaremos bobagem. Assim como sei que és o único que pegaria o carro no meio da noite e me tiraria à força de dentro de um bar qualquer. Tudo para me dar sermão, caso precisasse.
Bom, o que eu verdadeiramente sei, é que estás ali. Viro a cabeça e não te enxergo como antes, porém sei onde estás. E enquanto eu souber que te terei comigo e te terei contente, é o que importa para mim.

Porque eu ainda me vejo ali, pequena, olhando e admirando. E eu queria ser como ele. Na maior parte do tempo, eu tentava ser.
A verdade, é que eu ainda tento, e eu ainda quero. Porque heróis serão sempre heróis, não é mesmo? Independente de onde estiverem. Independente da capa ou do poder que possuam. Independente, até mesmo, se saibam disso ou não.

Fragile Bird

Ultimamente a vontade não lhe diz olá. Convive com o cansaço, a dor.
Nem mesmo fazer o bem importa mais.
Toda tua fortaleza desabou. Tornou-se resquícios de um voo seguro.
Mas não chore mais, pássaro da asa quebrada.
Bata essas tuas asas para um novo começo.

quarta-feira, 8 de agosto de 2012

Aquele do homem

Oh, meu bom jovem... Por que juras que és o mais forte? Ainda lhe resta muito tempo para descobrir o quão inconsequente se tornarás. Talvez seja encontrado afogando as primeiras mágoas num certo bar da cidade. Sairá de lá após bebericar algumas cervejas, cheirando a cigarros de estranhos, e acabará por se perguntar o porquê da vida ser cruel ao ponto de lhe causar uma dor tão irracional.

Após longos anos, ao recostar-se numa cadeira qualquer, recordará os ditos e sentirá infelicidade e amargura por não ter conquistado a sorte.
Restarão, então, desagrados da juventude. Restarão, até, mágoas para serem descontadas ao primeiro que vier à vista.

Oh, sábio senhor... Por que acreditas ser o único que conhece da vida? Não passas de pedaços de carne velha e gasta tentando recriar história. Uma história que só poderá se fixar dentro de um antigo livro, de páginas amareladas e com a escrita gasta. Talvez possua conhecimento o bastante para sentir-se no dever de dar puxões de orelha em seres mais fracos. E isso só provará o quão tolo és e sempre foi.

Após pouco tempo, cairá em si, dando-se por conta do tempo que perdeu julgando e esquecendo-se de julgar-se.

Restará, enfim, apenas uma taça de vinho e uma lareira acesa em dias frios. Restará, ainda, a solidão. Aquela que, posterior a todas suas cabeçadas na parede, se tornará uma fiel companheira.

segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Rabisco tortuoso

Queria eu pronunciar belas palavras, ser sábia aos teus olhos. Queria eu contemplar toda a tua magnitude, todo o teu esplendor.

Mas sou apenas uma, pequena entre tantas. Uma sozinha.

Sou apenas rascunhos em tua folha de papel.

De verde forte e falso e vivo e raro

Consegue escrever algo bonito e isso já te torna memorável. Exibe uma aparência plena, como seda, e este detalhe já faz de ti um exemplo a ser seguido.
Chega de trocar corações quentes por espinhos de rosas.
Saiba que até a grama mais verde pode estar te enganando.