sábado, 15 de dezembro de 2012

Um andarilho qualquer

Era um andarilho jovem, angustiado com a vida e, constantemente, atormentado pelos seus fantasmas, os quais geravam pensamentos sórdidos e assustadoras visões em sua mente depressiva.

Ao enrubescido céu do crepúsculo, traçava suas metas e planos. Seguia pelos trilhos de um velho trem desativado, contemplando a obscuridade que habitava dentro de seu cansado corpo aventureiro.
Seus pais e conhecidos diziam que sua aura nascera impregnada de tolice e sujeira. Ignoravam seus sonhos, sua notória criatividade e imaginação. Um alguém, mais conhecido como ninguém, crendo no ilusório. Havia mal viver de devaneios, diziam os olhos julgadores, amedrontados pelo desconhecido.
Era por isso que fugira. Deixou para trás seus poucos afetos e bens. Caminhou incansavelmente, sem para os lados olhar. Subiu colinas, atravessou riachos, dobrou esquinas não dobráveis. Tornou-se um passarinho que dava seu primeiro voo sozinho.
Marchou em direção ao nada e ao tudo.
Alguns dizem que encontrou a luz pela estrada. Outros falam que deu de cara com o fim e voltou ao começo. Mas, os mais mortos, creem que o andarilho nunca saiu das folhas e rabiscos de um caderno qualquer.

segunda-feira, 8 de outubro de 2012

Quem sabe com o tempo...

Eu nunca entendi o ciúme. Aquele exagerado, egoísta, que tende a criar paranoias na mente das pessoas. Tudo bem um que seja leve, feito vento no cabelo. Apenas um zelo de amor.

Eu nunca entendi muito bem aqueles que correm atrás do outros. Se o dito cujo não está nem aí, por que a correria? Relaxa e senta. Entra na roda de chimarrão. Quem se importa, se importa.
Eu nunca entendi aquela pressa de amar, a rapidez em soltar um “Eu te amo”. É essa precipitação que acaba com os relacionamentos. Primeiro, pega a mão. Abraça, beija a testa. Olha sincero. Fala baixinho.
Eu nunca entendi mulher que prefere salto alto. Põe esse pé no chão, garota! Fecha os olhos e sinta a terra adentrar e acariciar seus dedos. Ou põem um tênis, opte pelo confortável.
Eu nunca entendi homem que coleciona garrafas de uísque e fuma cigarros. Bebe uma cerveja gelada, rapaz! Vai lá e cria uma barriga. Troca a tosse da fumaça por uma bala de hortelã.
Eu nunca entendi porque a magreza é sinônimo de beleza. Engorda essa coxa, para de reclamar do culote! Cuida do corpo, mas, permita-se ter onde apertar.
Eu nunca entendi a vontade da humanidade em tornar-se gente grande. Qual a alegria em abandonar bonecas, carrinhos, jogos, ursos de pelúcia? Pega tudo e brinca de ser criança. Pinta a infância aí dentro. De vez em quando faz bem.

Eu nunca entendi quem não gosta de escrever. Por pra fora, limpar as gavetas, esvaziar as caixas, colocar em ordem os arquivos mentais. Arranca uma folha de papel, rabisca um desabafo com a caneta. Não precisa mostrar, guarda com segurança embaixo do travesseiro.
Eu nunca entendi quem não gosta de animais, quem não conversa sozinho, quem não faz caretas na frente do espelho, quem não tem cócegas nos pés, quem não canta no banho.

Eu nunca entendi gente que não chora, gente que não ri.
Eu nunca entendi porque janeiro passa tão rápido e porque não é frio o ano inteiro. Eu nunca entendi porque gosto da lua, porque sonho com estrelas, porque escrevo sobre borboletas, porque quero um campo de girassóis só pra mim.
Eu nunca entendi porque brinco de tentar ser poeta.

Até finjo que não entendi, e continuo aqui. Eu nunca entendi porque não entendo.

Mas, quem sabe com o tempo...

sexta-feira, 5 de outubro de 2012

Sobre rostos e corpos

Espero-te, escondida nas sombras. Quando a noite cai e teu instinto floresce, debatendo-se contra o corpo que insiste em se esgueirar na busca por proteção racional.
Apreendo um desvio de olhares. No instante em que, por sigilo, as mãos se topam, e se enroscam, e pedem por mais.
Cheiros e peles se encontram num misto de únicas sensações - o de roçar a nuca, o de acalentar os membros - tais quais liberam comodidade, familiaridade.
De repente o lado obstinado se entrega. Fecho os olhos e te transformo num desenho posto ao espaço infinito. No mesmo lugar estamos, no qual se movem os astros.
Ora para recomeçar, ora para terminar.

E agora me ato ao desconhecido. Espero-te, sentada num toco de madeira. Olhando para o céu em aguardo a uma nova nuvem que virá a se formar com os traços de teu rosto.

Ei, pequeno conquistador!

Por onde andas sua amada?
Subiu a torre mais alta, do castelo mais distante, implantado em meio as defesas mais assustadoras para encontrar apenas o vento batendo na cortina sobre a cama vazia.
Não encontrou a moça de seus sonhos e gastou uma vida inteira a procurar.

Mal sabia o príncipe que sua princesa encontrava-se logo ali, jogando sinuca e tomando cerveja no boteco da esquina.

segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Nacos de amor

Alfonso era um homem muito bondoso. Desde pequeno sua mãe lhe ensinara a ser um ser humano digno de ternura. Sem pedir nada em troca, ia doando parte de si onde quer que fosse.

Possuía o abraço mais reconfortante de todos. Quem o tinha, gostaria de construir lá sua morada.
A cada rosto triste que encontrava, distribuía uma fatia dos seus sentimentos. Nascera para espalhar amabilidade nas bocas do mundo.

Certo dia, encontrou uma jovem por quem se apegou demasiadamente. Sorriu e lhe entregou o último pedaço que restara de seu coração.
A garota, assim como todos os outros que ganharam um pedacinho deste amor, era só felicidade. Agradeceu a grande solidariedade, e partiu.
Foi então que, visto a ida de mais um apego, Alfonso se deu conta de que havia dado todo seu coração e esquecido de guardar um pedaço para si próprio.

Agora todos partiram sorridentes, sem nem mesmo se despedir do tão caridoso rapaz que ficara ali sozinho, tentando, em vão, preencher o vazio que lhe fora instalado no peito.

quarta-feira, 5 de setembro de 2012

Nunca mais ouvi barulhos

O ranger da porta da frente, abrindo e fechando, é tudo o que ouço.

Culpa do vento... culpa minha.


segunda-feira, 3 de setembro de 2012

São apenas devaneios de uma alma doentia

Apagou no sofá, noite passada; dos males, o pior. Desta vez conseguiu alcançar algo mais cômodo do que o chão da cozinha. Novamente, não ligou para os arredores, não ligou para nada. Era apenas ela e o estofado bordô.O teto ainda girava quando o subconsciente tomou conta do seu corpo e o levou para um lugar melhor, mais tranquilo. Apesar do agitamento do lado de fora, dentro, em sua mente, vivia-se o oposto. A calmaria era tanta que não chegava a sonhar. Não gostaria de ser surpreendida por barulho, caos. Mas, quem sabe... Talvez sonhasse. Talvez a mente fizesse o favor de apagar seus sonhos para que não desistisse de algo novamente.Seu espírito precisava descansar.Então durma minúsculo ser, somente durma. Relaxe a cabeça, cubra os pensamentos e descanse o coração, para sempre. Ou por apenas hoje.

quinta-feira, 30 de agosto de 2012

Da porta trancada

É chato querer se doar de novo e não saber por onde começar. Quer dizer, de repente batem à tua porta e tu não sabes o que oferecer.

Ei, podes passar mais tarde? Alguém já veio aqui antes e levou tudo embora.

Já chega disso

Parem de falar absurdos, parem de achar que sabem de tudo!

Desliguem a linha de raciocínio e vão dormir.

sexta-feira, 24 de agosto de 2012

Fogo

O calor mantinha seu corpo aquecido, afogueado. O fogo queimava, ardia e, ainda sim, lhe fazia bem. Era a base de todo o controle humano. Causava torpor.
Mas mesmo com todo o seu interior acalorado, mesmo com o arrepio de pele e a exaltação descontrolada, continuava por escolher as grandes pedras de gelo. Aquelas frias, sem sentimentos, onde criara seu abrigo contra o ardor.
E permanecerá assim, amarrado entre boas e quentes sensações e a fria paz na consciência.
E continuará movendo-se entre semelhantes geleiras, em cada tentativa frustrada de fazer cessar a chama.

quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Catuípe

Já faz anos. Os móveis se foram, o aposento se transformou em outro cômodo qualquer.
Porém, admito, sinto saudade daquele tempo em que eu brigava por um pacote de bolachas ou discutia pelo controle da TV. Um tempo em que eu não me sentia tão sozinha. E, provavelmente, ele não saiba de nada. Talvez não desconfie do quanto é importante pra mim. O quanto faz falta.
Mas agora há mais paredes nesta casa. Também há mais silêncio, menos motivos para risadas.
Em verdade, nunca fui boa ao expressar emoções. Entretanto, confesso que até hoje abro um sorriso quando vejo seu carro parado em frente ao portão.
Minha memória também não é lá grandes coisas. Esqueci detalhes, mas os importantes ficaram, garanto. Lembro-me de sentir orgulho ao perguntarem se eu era a sobrinha do “Catuípe”. Recordo-me daquele cara cabeludo, me carregando nas costas. O mesmo que me ajudava a cavar buracos e construir castelos de areia. E dói um pouco saber que não o encontrarei quando eu acordar. E dói ainda mais quando lembro que, após receber xingamentos, não terei ninguém em minha defesa. Muito menos terei um espaço entre o armário e a cama, no quarto ao lado, o vão onde poderei me esconder.
Mas eu sempre fui só, nunca reclamei. Jamais tive motivos para tal reclamação. Eu tinha aquele que me foi dado como tio, aquele que eu insisti e transformei em irmão. Só eu sei a saudade que bate às vezes.

E agora eu cresci, e ele continuou a crescer. Eu não o olho mais de baixo e a gente não discute mais por futilidades. Eu não o vejo todos os dias, ele não repete a típica reclamação de eu ser “a criança mais insuportável do universo”. Também não me preocupo mais ao comer uma sopa, sei que não terás enchido a mesma com pimenta quando ninguém estiver olhando. Pois não estás aqui.
Lembro, tristemente, de algo mais recente: chorar e ver o ser mais forte de todos, chorando. E as vezes me pergunto se estás bem, se estás feliz. Porque, de repente, desvairou-se, como água entre os dedos. Não pude impedir.
Eu só sei que, do nada, partiu. Lembro que fiz pouco caso, ignorei abraços e um pedido de “fica”. De qualquer forma, não teria adiantado. Eu sei que, ainda sim, ele iria. Pois precisava, já eras hora.
É claro, eu sei que sempre que precisar estarás aqui. Sei que sabemos nos entender apenas com gestos e pensamentos. Sei que não teremos muito assunto, falaremos bobagem. Assim como sei que és o único que pegaria o carro no meio da noite e me tiraria à força de dentro de um bar qualquer. Tudo para me dar sermão, caso precisasse.
Bom, o que eu verdadeiramente sei, é que estás ali. Viro a cabeça e não te enxergo como antes, porém sei onde estás. E enquanto eu souber que te terei comigo e te terei contente, é o que importa para mim.

Porque eu ainda me vejo ali, pequena, olhando e admirando. E eu queria ser como ele. Na maior parte do tempo, eu tentava ser.
A verdade, é que eu ainda tento, e eu ainda quero. Porque heróis serão sempre heróis, não é mesmo? Independente de onde estiverem. Independente da capa ou do poder que possuam. Independente, até mesmo, se saibam disso ou não.

Fragile Bird

Ultimamente a vontade não lhe diz olá. Convive com o cansaço, a dor.
Nem mesmo fazer o bem importa mais.
Toda tua fortaleza desabou. Tornou-se resquícios de um voo seguro.
Mas não chore mais, pássaro da asa quebrada.
Bata essas tuas asas para um novo começo.

quarta-feira, 8 de agosto de 2012

Aquele do homem

Oh, meu bom jovem... Por que juras que és o mais forte? Ainda lhe resta muito tempo para descobrir o quão inconsequente se tornarás. Talvez seja encontrado afogando as primeiras mágoas num certo bar da cidade. Sairá de lá após bebericar algumas cervejas, cheirando a cigarros de estranhos, e acabará por se perguntar o porquê da vida ser cruel ao ponto de lhe causar uma dor tão irracional.

Após longos anos, ao recostar-se numa cadeira qualquer, recordará os ditos e sentirá infelicidade e amargura por não ter conquistado a sorte.
Restarão, então, desagrados da juventude. Restarão, até, mágoas para serem descontadas ao primeiro que vier à vista.

Oh, sábio senhor... Por que acreditas ser o único que conhece da vida? Não passas de pedaços de carne velha e gasta tentando recriar história. Uma história que só poderá se fixar dentro de um antigo livro, de páginas amareladas e com a escrita gasta. Talvez possua conhecimento o bastante para sentir-se no dever de dar puxões de orelha em seres mais fracos. E isso só provará o quão tolo és e sempre foi.

Após pouco tempo, cairá em si, dando-se por conta do tempo que perdeu julgando e esquecendo-se de julgar-se.

Restará, enfim, apenas uma taça de vinho e uma lareira acesa em dias frios. Restará, ainda, a solidão. Aquela que, posterior a todas suas cabeçadas na parede, se tornará uma fiel companheira.

segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Rabisco tortuoso

Queria eu pronunciar belas palavras, ser sábia aos teus olhos. Queria eu contemplar toda a tua magnitude, todo o teu esplendor.

Mas sou apenas uma, pequena entre tantas. Uma sozinha.

Sou apenas rascunhos em tua folha de papel.

De verde forte e falso e vivo e raro

Consegue escrever algo bonito e isso já te torna memorável. Exibe uma aparência plena, como seda, e este detalhe já faz de ti um exemplo a ser seguido.
Chega de trocar corações quentes por espinhos de rosas.
Saiba que até a grama mais verde pode estar te enganando.

quinta-feira, 12 de julho de 2012

Sobre gostar

Quando a primeira estrela surgir no céu; quando o primeiro pássaro cantarolar pela manhã.

Não tenha medo.

O vento sopra. E você? Simplesmente decola.
Há muito além dessa colina de incertezas.

segunda-feira, 25 de junho de 2012

Aos seres impróprios

Andava rastejando, angustiada; sempre de rosto abaixado, seguia pela senda.

Perguntavam-na o por quê do excêntrico. Estava destinada a permanecer em uma natureza diferente.

Os anos passaram e acostumara-se ao rótulo que a vida lhe dera.

Ao ser taxada de inadequada, criou sua bolha. Crescera sozinha lá dentro, até que, em certo momento, resolveu afastar as cortinas e retirar um pouco do pó que se acumulara após tanto tempo.

Levantou, abriu a janela, e novamente enxergou os olhos de desprezo e crítica. Porém, desta vez, não se sentia deslocada. Ao contrário! Existiam motivos para mostrar os dentes.

Sorria e erguera a cabeça. Dava de ombros.

Criaram-na do lado contrário e, quer saber? O avesso era seu certo.

sábado, 23 de junho de 2012

Quando o impulso nos empurrar, não restará mais nada. Talvez uma ponte, talvez apenas o rio.

Um coração bonito não é um coração inteiro

Escolha sua cor, afinal, somos borboletas.

Precisamos sentir a dor de rasgar o casulo, ou... conseguiríamos passar o resto de nossas vidas rastejando, sem desfrutar da beleza de um par de asas?

domingo, 17 de junho de 2012

quinta-feira, 14 de junho de 2012

Nesses dias

Sentada na calçada com as pernas esticadas, arrancava as botas.
Com um movimento vertiginoso, retirava o batom dos lábios, apagando a cor que lhe sobressaía.
Restava a maquiagem borrada e a roupa rasgada.
Os olhos brilhantes, feito bolita, não controlavam as lágrimas que deslizavam pelo seu rosto.
O que antes era hábito, agora se via amargo.
Transformara a figura num completo vazio.

Um refúgio

Toda sua vida sentira necessidade de expressar-se, porém seus pés mantinham-se em terras inapropriadas, fazendo com que sua boca permanecesse calada.

Faltava um chão seguro, faltava o ar leve e o cheiro do pão caseiro.

Mas agora tirara a fita isolante e podia gritar; gritava como jamais pudera.

E com um grito no silêncio, ouvia-se tudo o que tinha a dizer.

sábado, 26 de maio de 2012

Borboleta amarela

Lembro de tempos remotos.
Via-me pequena, contando borboletas que sobrevoavam as flores do quintal.
Eram tantas! Diferentes cores e tamanhos. Mas, na mente, guardava as amarelas.
Recordo de sua luz, brilhante, confundindo-se com o calor vindo do sol.
Inconscientemente, misturava-me com seu esplendor.
Guardo aqui dentro, é a mais nobre das lembranças.

Eu não sei se foi o tempo, mas aquela fulgura sumiu.
Não existem mais tantas borboletas colorindo o céu.
Talvez seja eu.
Cresci e esqueci. Deixei de ser aquela pequena perante o simples.

Mas ainda existe o amarelo em mim, essa cor nunca me deixou.
Provavelmente está no fundo, escondida.


Entretanto, sempre me pego pensando nela.
Vai e volta. Reacende em forma de sorriso.

domingo, 20 de maio de 2012

Decesso

Uma trilha de cacos de vidro no asfalto é o que se enxerga.
O ar gélido mantém o tom de luto. Paisagem cinza.
Bocas de espanto; olhares sedentos pela escuridão.
Através de janelas e portas, pessoas espiam para saber o que se passa. Porém, atitude alguma é tomada.
O sangue continua a escorrer.
Nada pronunciado. Nada é resolvido.
Aquele corpo, atirado em meio ao terreno isolado, chamara a atenção dos curiosos. Formara-se uma ignorante aglomeração de pessoas que, agora, divertiam-se com a desgraça.
Seres imundos. Sentiam paz e plenitude ao ver a carcaça presente, como se a falsa comoção fosse lhes render o céu.
Um ser havia sangrado e a ruela estava infestada de hipócritas.
O chão frio, azul. Cena lenta.
E eu ali, perdida. Não havia motivos para estar presente.
Perguntava-me o por que de ainda estarem olhando para a moça ensanguentada. Até se dar conta de quem se tratava.

Bem, também passara a observar.
Olhava daqui, insípida. Olhava para si mesma.
Via os traços inexpressivos e notava as mentes fervendo ao redor do cadáver duro.
Tentava sussurrar algo, mas era em vão.

Já estava morta.

quarta-feira, 2 de maio de 2012

Nada além de um desejo

Um campo bem verde, cachorros correndo, girassóis em tamanha quantidade e uma velha casa no topo da montanha.

Frio, vento na medida exata e o sol fraco, porém, brilhante.

O cabelo dourado esvoaçando e o tênis surrado formavam o par perfeito para o moletom preferido.

Shorts, pois as pernas não sentiam a temperatura como os braços.

Após um tempo parada, admirando a paisagem, fizera um pedido.

Outro alguém surgira na cena.

Um coração pulsante na encosta do morro e um sorriso tímido que liberava endorfina à quilômetros de distância.

Poucas e leves nuvens, brisa calma e aconchegante e o soar dos pássaros.

Silêncio esteriótipo e uma euforia barulhenta do lado de dentro.

Um espaço cada vez menor entre os personagens. Respiração exagerada e uma sensação de paz espiritual.

Ao fundo, ouvia-se um som inapropriado para o momento. Uma música chamada realidade, que afastava toda a beleza do sonho.

Sim, sonho. Despertara e se deparara com nada mais, nada menos, do que um quarto escuro e rachaduras na parede.

segunda-feira, 30 de abril de 2012

Dúvida interna

O calor do fogo. A chama. O rubro.

Reacendeu.

Verdadeiro ou ilusão... antecipação?

Mente atordoada.

Não pensar, mas continuar sentindo.

Agora existe o saber e a certeza da dor que vem. Agora há prevenção, receio, barreiras que o próprio corpo criou. Menos aquela parte que deveria bombear sangue. Continua querendo mais, não aprendeu. Insiste em possuir tatuagens da amarga vivência e destruir tudo aquilo que ainda é puro ou que, talvez, mantêm-se belo mesmo após os danos.

sexta-feira, 20 de abril de 2012

Decorrências

A luz do bar, fraca como de costume, juntamente com a temperatura alta, fazia com que a maioria ali presente optasse por permanecer do lado de fora do estabelecimento. Ao som de Led Zeppelin, as pessoas formavam grupos de conversação embaixo do antigo poste de luz amarelada.

A garota prendia o cabelo e se recostava para trás, enquanto o garoto buscava dois copos de cerveja e cumprimentava os conhecidos que ali estavam.

O assunto daquela noite era o mesmo de todas: nenhum em particular. O casal de amigos conversava tanto sobre música, quanto como assuntos mais complexos. Às vezes religião, às vezes política. Mas, por mais que falassem de violetas ou de dimensões do universo, sempre acabavam em altas risadas porque, no fundo, nada daquilo que saía de suas bocas era para ser levado a sério. Ou, pelo menos, ser considerado relevante no momento.

Em meio a palavrões e carinhos, insultos e abraços, os dois formavam uma perfeita sincronia. Haviam formado um vínculo tão forte, que nada mais os separara. A vida os tornara irmãos.

Ao fim de mais uma tarde rendida à alegria que um ser pode transmitir ao outro só pelo fato de se fazer presente, conversavam mais uma vez, porém agora, por telefone. Relembravam tudo o que acontecera, e gargalhavam ao recordar das bobagens ditas. Sendo confidentes e sinceros, sempre permaneciam iguais um perante o outro.

Mas, o futuro chamou, trazendo consigo a mudança.

Era fim de estação e os dias encurtaram. Da porta do bar, já se podia sentir o vento, imponente, fazendo com que todos fossem obrigados a colocar seus casacos de tom neutro e suas jaquetas de couro.

O tempo havia passado e não mais as mesmas pessoas se encontravam ali. Não havia mais sorrisos, não havia mais barulho. Havia apenas um silêncio profundo que ofuscava o sombrio da noite.

Alguém começara a sentir demais. Colocara sentimentos muito fortes, além da amizade, e quebrara o elo de conexão segura que existia entre as duas pessoas.

Passavam não mais a ter assunto. As horas eram demoradas, e o brilho da lua era a única paz do lugar.

Os copos, agora, encontravam-se vazios, a mente recheada, e o coração com um buraco sem fim, aonde o som da pedra jogada, jamais seria ouvido bater ao chão.

O mundo causa isso. Nos leva a amar, nos impõem a sentir. E como resultado, vivemos um sofrimento inesgotável, que elimina quaisquer possibilidades de lutarmos.

Por que não podemos ser fortes, frios, inabaláveis? Por que não podemos apenas sentar e apreciar a companhia de quem nos faz bem, pra sempre, sem causarmos um maldito de um caos emocional?

segunda-feira, 16 de abril de 2012

Desapego ao apego


Não, não me iluda mais. Não crie expectativas onde não existe.
Sente aqui, me faça rir até a barriga doer, e vá logo embora. Mas, antes de partir, me pague uma bebida.
Deixe-me sempre querendo mais, porém, não ao extremo. Não pretendo me apegar.
Sim, me aqueça sim. De sorrisos e risadas espalhafatosas.
Levante e fique parado ao meu lado. Mas, antes de pensar em permanecer aqui, pergunte-se o quanto aguentaria.
Apenas me abrace ao invés de tentar provar um sentimento ao mundo. Palavras não provam nada.
Bagunce meu cabelo e critique aquela velha camiseta de minha banda favorita. Aperte minhas bochechas e imite minhas gírias próprias. Zombe meu time, faça piadas internas, me irrite.
Deixe-me louca em todos os sentidos. Deixe-me te querer por perto por ser quem você é.
Não aponte meus defeitos ou tente consertá-los, só diga “ei, eu te aceito maluca desse jeito”.
É desse tipo de paixão que eu quero e é desse tipo de amor que eu preciso.
Tome uma xícara de café e mande-me uma mensagem comum ao entardecer.

Assim como você me surpreendeu da forma como apareceu em minha vida, seja a pessoa a qual irei surpreender com um “não saia mais dela”.

sábado, 14 de abril de 2012

Mais um dia no inferno

Você não escuta nada além da chuva caindo.

Seus planos escorrendo entre os dedos e sua vontade de fugir só aumentando a cada suspiro.

Seu coração está endurecendo.

Você não escuta nada além do vento batendo à porta.

Você não sente mais necessidade de responder ou tentar consertar. Você não se encaixa mais ali.

As lágrimas secaram. Sua emoção congelou no passado, pois, o tempo, agora, te transformou num vilão sem compaixão ou arrependimento.

À sua mente, uma estrada. Apenas isso.

Por onde andaria os sorrisos do passado? Onde você errou?

Você só queria a paz de um dia no céu.

Agora você está morto por dentro.

terça-feira, 20 de março de 2012

Enfim, passos ao fim

A pequena garotinha via a mudança resplandecendo seus horizontes. Dava-se por conta de que os tempos mudaram. Ainda risonha; sempre sonhadora. Mas, de certa forma, mais convicta do que estava por vir. Como lagartas que deixaram de ser venenosas, para se transformarem em belas borboletas.

Não havia medo, não existia insegurança. Sorrisos a encantavam, mas não mais a convenciam.

Dentro de si, havia apenas a busca incessante pelo desconhecido e mágico. A plena insistência de dar de cara com seu verdadeiro ser.

Numa esquina qualquer, numa esquina da vida.

quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

O tempo do coração

Passam dias, passam noites. Passam tardes, passam manhãs. O pensamento sempre é o mesmo. Acho que de vez em quando isso deveria mudar ou simplesmente desacelerar o ritmo. Mas quando uma granada é lançada, temos pouco tempo antes de ela explodir.
Segure o fôlego. Não é o fim do mundo, mas sim, o início dele. Se você pensa que vai esquecer está enganado. Isso prevalece. Dormente, mas continua ali. Esperando para ser vivenciado outra vez. Mas tudo tem o seu devido tempo.
O teu pensamento não é mais o mesmo. Agora existem outras sensações florescendo. Mas aquele sentimento ainda está ali, intacto.
Você cresceu, amadureceu, estudou e se formou. Você casou, teve filhos, ou talvez não. Você seguiu outros passos. Mas ainda sim aquele caminho que parece nunca ter saído de ti, volta a tona. Um dia você tem seu coração pulsando loucamente, novamente. E então você percebe que ainda não mudou. Você reencontra aquilo que talvez nem soubesse que tinha perdido. Você fugiu, mas a vida te reencontrou. Passaram dias e noites, tardes e manhãs, pra só agora você entender aquilo que te fazia sorrir sem motivo.